Paz no Senhor

SERMÃO SOBRE A GLORIOSA RESSUREIÇÃONa Colheita dos Sermões* – Damasco – Síria – 1984 – pág. 51-59O apóstolo Paulo diz: Justificados, pois pela fé, tenhamos paz com Deus por meio de Nosso Senhor Jesus Cristo (Rom 5: 1) O qual foi entregue por nossos pecados, e ressuscitou para nossa justificação. (Rom 4: 25)Jesus Cristo inclinou sua santa cabeça sobre a cruz e submeteu seu espírito puro nas mãos do seu Pai Celestial e morreu. Ele morreu; aquele que deu vida aos mortos através do seu poder divino curou os doentes, tornou limpos os leprosos, fortaleceu os joelhos dos incapazes, abriu os olhos dos cegos, encaminhou os perdidos fortalecendo-os no seu trajeto, trouxe arrependimento aos pecadores. O que foi escrito pelo profeta Isaias foi por Ele cumprido: O Espírito do Senhor repousou sobre mim, pelo que Ele me consagrou com a sua unção e enviou-me a pregar o Evangelho aos pobres, a sarar os quebrantados de coração. A anunciar aos cativos redenção, e aos cegos vistas, a por em liberdade aos quebrantados para seu resgate. (Lucas 4: 18; Is 61: 1) Ele morreu: aquele que as multidões seguiam vindas de todos os lugares para ouvir seus ensinamentos celestiais. Porque ele os ensinava como quem tinha autoridade, e não como os escribas deles e os fariseus. (Mt. 7: 29) No seu sermão da montanha disse-lhes: Bem-aventurados os pobres de espírito: porque deles é o reino dos céus… Bem aventurados os pacíficos; porque eles serão chamados filhos de Deus. (Mt. 5: 3 e 9). 

Não satisfeito com isso, outorgou a Lei Áurea de como a humanidade deve proceder no companheirismo humano dizendo: E assim tudo o que vós quereis que vos façam os homens, fazei-o também vós a eles. (Mt. 7: 12)

Quando uma pessoa é liberta do egoísmo, ama o Senhor de todo o seu coração e com toda a sua vontade, e, ama o seu próximo como a si mesmo; ela será capaz de cumprir o mandamento do Senhor e alcançar a perfeição cristã cumprindo o mandamento do Senhor que diz: Amai a vossos inimigos, fazei bem aos que vos têm ódio: e orai pelo que vos perseguem e caluniam para serdes chamados filhos de vosso Pai, que está nos céus. (Mt. 5: 44-45) O Pai Celestial prova o seu amor por nós: porque ainda quando éramos pecadores em seu tempo, morreu Cristo por nós. (Rom. 5: 8) Isto é sacrifício amoroso que não faz exigências para si mas para os outros. Um amor que quebra as barreiras raciais e destrói as divisões sectárias entre a humanidade e ensina os povos a fraternidade mútua: Porque assim amou Deus ao mundo, que lhe deu seu Filho unigênito: para que todo o que crê nele, não pereça, mas tenha a vida eterna. (Jo. 3:16)

A morte de Cristo na cruz foi necessária para a salvação da humanidade, como cita o credo niceno: que para nós homens, e, para a nossa salvação desceu do céu e encarnou-se do Espírito Santo e da Virgem Maria, Mãe de Deus. Tornou-se homem, foi crucificado sob o poder de Pôncio Pilato, padeceu, morreu e foi sepultado, e, ao terceiro dia ressuscitou. O apóstolo Paulo diz sobre este assunto: O qual foi entregue por nossos pecados, e ressuscitou para nossa justificação. (Rom. 4: 25)

O Senhor Cristo, na sua morte foi um substituto: Ele morreu ao invés da humanidade, e, a sua morte foi necessária para a redenção desta humanidade com a justiça de Deus para reconciliar entre a Sua justiça e a Sua misericórdia. Isto foi feito propositadamente, por Sua própria vontade e desejo do Seu Pai Celestial. Enquanto Ele era o Deus encarnado, livre de todo pecado, infalível, Ele tomou o lugar da humanidade pecadora e suportou por Sua vontade todo o sofrimento no lugar dela (humanidade).

Ele morreu na cruz para fazer a paz com nosso Pai Celestial como diz Paulo o apóstolo: Aquele que não havia conhecido o pecado o fez pecado por nós, para que nós fossemos feitos justiça de Deus nEle. (II Cor. 5: 21) Cristo nos remiu da maldição da lei, feito Ele mesmo maldição por nós. (Gal 3: 13) E o apóstolo Pedro diz: O qual foi o mesmo que levou os nossos pecados em seu corpo sobre o madeiro: para que mortos nos pecados, vivamos à justiça: por cujas chagas fostes vós sarados. (I Pe. 2: 24)

Jesus poderia ter se livrado das mãos dos seus inimigos os judeus e os romanos. Mas foi determinado que Ele beberia daquele cálice da morte para salvar a humanidade como Ele próprio disse: O filho do Homem veio para servir e não para ser servido, para sacrificar-se pela redenção de muitos. Sim, Cristo morreu e o seu último ato foi a tragédia no Golgota que terminou na sexta feira ao entardecer quando ele entregou seu espírito nas mãos do seu Pai Celeste e foi lancetado no flanco por uma lança e dele jorrou água e sangue. Seus inimigos estavam certos da sua morte. Com a permissão de Pilato o governador, José de Arimatéia e Nicodemo desceram seu corpo puro da cruz, untaram-no com incenso e aromas envolvendo-o em linho. Enterraram-no num túmulo novo escavado na rocha. Uma pedra cerrava a entrada do túmulo. Por ordem de Pilato, atendendo o pedido do sumo sacerdote dos judeus, o túmulo foi lacrado com os selos da autoridade romana. Soldados foram postos para guardá-lo porque depois de seus inimigos matarem-no fisicamente, lembraram-se do que dissera: Eu hei de ressurgir depois de três dias…Eles porem, retirando-se, trabalharam por ficar seguro o sepulcro, selando a campa e pondo-lhe guardas. (Mt. 27: 63, 66).

Sim, Cristo morreu na cruz e foi sepultado num túmulo novo. Ele morreu: aquele que fez um azorrague com as cordas e expulsou os vendilhões do templo do Senhor. Os judeus perguntaram-lhe: Que milagre nos faz tu, para mostrares que tens autoridade para fazeres estas coisas? Respondeu-lhes Jesus; Destruí este templo, e eu o levantarei em três dias. Replicaram logo os judeus: Em se edificar este templo gastarem-se quarenta e seis anos, e tu hás de levantá-lo em três dias? Mas Ele falava do seu corpo. Assim que depois que Ele ressurgiu dos mortos, se lembraram seus discípulos do que Ele dissera, e creram na Escritura, e nas palavras que Jesus tinha dito. (Jo. 2: 18-22)

Na madrugada do domingo, as mulheres vieram ao túmulo para ungir o seu corpo de acordo com a tradição quando viram a pedra grande rolada para o lado da porta. Encontraram o sudário dobrado não demonstrando pressa, ansiedade, medo ou alarde. Dentro do sepulcro viram um anjo que lhes disse: Não tenhais pavor, vós buscais a Jesus Nazareno, que foi crucificado. Ele ressuscitou, já não está aqui; eis o lugar onde o depositaram. (Mc. 16: 6).

O Redentor levantou-se dos mortos e saiu do sepulcro apesar da existência da pedra grande à porta. Sua luz divina ofuscante espalhou-se em todo o lugar quando o anjo veio e rolou para fora a pedra da porta do túmulo para que as mulheres e os discípulos pudessem ver o sepulcro vazio. Um terremoto amedrontou os guardas que caíram sobre suas faces e ficaram como que mortos. Eles correram para a cidade a fim de informar seus mestres que Cristo tinha ressuscitado. Mas os chefes dos sacerdotes judeus endureceram seus corações e perderam a oportunidade áurea de se arrependerem e voltarem-se para Deus crendo em Jesus o esperado Messias, ao contrário, subornaram os guardas com prata para que ficassem quietos e emudeceram suas línguas para que não falassem a verdade: aquele que silencia a verdade é um diabo mudo (provérbio oriental). Assim mudaram para um falso testemunho. Tenham piedade deles no dia do juízo final.

A verdade da ressurreição de Nosso Senhor Jesus Cristo é clara como o sol do meio dia. Podemos tapar o sol com uma peneira? Cristo ressuscitou! Em verdade ressuscitou! O que o profeta Davi disse foi cumprido: Não abandonareis a minha alma no Sheol, nem permitireis que o vosso santo veja a corrupção. (Sl 15: 10 e At 2: 27). Sim Cristo levantou-se dos mortos e apareceu aos seus discípulos várias vezes em muitos lugares. Numa destas vezes apareceu para mais de quinhentas pessoas. Elas viram-nO com seus olhos, tocaram-nO com suas mãos, escutaram-nO com seus ouvidos, comeram e beberam com Ele, e Ele por sua vez, comeu e bebeu com todos eles.

No dia da ressurreição apareceu para Maria Madalena, a mulher, para Pedro e para os dois discípulos que estavam viajando para Emaus. No entardecer daquele dia, quando os discípulos estavam reunidos no Quarto Superior** com medo dos judeus, trancaram-se e estavam certos de estarem trancafiados. Seus corações estavam ansiosos e cansados; suas almas estavam transtornadas e amedrontadas. Jesus apareceu no meio deles e lhes disse: Paz seja convosco (Jo. 20: 19) pensaram que fosse um fantasma, mostrou-lhes as mãos, os pés e o lado. Alegraram-se, pois os discípulos de terem visto o Senhor. (Jo. 20: 19 – 20). A alegria deles aumentou com a Sua expressão de paz. Ele quis dizer cada palavra…

Esta paz foi a melhor coisa que o Senhor Jesus deixou para os seus seguidores. É a tranqüilidade do coração, a paz da consciência, a esperança que não falha e a felicidade da esperança. Não importa quão forte ou violenta seja a tempestade, as nuvens negras espessas e os raios assustadores ou desesperadores: planamos na atmosfera do Espírito e nossas almas estão alegres, pois o cuidado de Deus nos envolve e Seu olho vigilante nos protege.

Sua promessa divina traz paz aos nossos corações. Ele disse: E até os mesmos cabelos da vossa cabeça todos eles estão contados. (Mt. 10: 30) A base da sua paz é a reconciliação com Deus, e este era o principal objetivo da encarnação do Redentor. Os céus declararam esta expressão de paz quando o anjo Gabriel trouxe a boa nova à Virgem Maria quando da sua gravidez de Jesus. Os anjos também cantaram a música da paz no dia do nascimento do Redentor dizendo: Glória a Deus no mais alto dos céus, e paz na terra aos homens de boa vontade! (Lc. 2:14) Antes da sua paixão o Senhor confortou os discípulos atribulados com expressões de paz dizendo: A paz vos deixo, a minha paz vos dou, e eu não vo-la dou como a dá o mundo. (Jo. 14: 27) Agora após a sua ressurreição ele deu a paz aos seus discípulos para que seus corações se rejubilassem porque viram o Senhor.

Em verdade hoje estamos necessitados, meus amados, da paz de Cristo Nosso Senhor: a paz alicerçada na Sua gloriosa ressurreição dos mortos. Isto porque a Sua ressurreição é a nossa garantia duradoura da s promessas do Senhor feitas ao mundo. Sua ressurreição alivia o modo de vida e nos prova que a verdade da Sua divina promessa que anunciou dizendo: Eu sou a ressurreição e a vida. O que crê em mim, ainda que esteja morto viverá. E todo o que vive e crê em mim, não morrerá eternamente. (jo. 11: 25-26).

Assim como há três tipos de morte – a morte moral, a morte natural e a morte eterna; assim, também existem três tipos de vida em Cristo – a vida moral, a vida natural e a vida eterna. Cristo através da Sua ressurreição dos mortos confirmou: nós que fomos sepultados com ele para morrer ao pecado pelo batismo: para que como Cristo ressurgiu dos mortos pela glória do Pai, assim também nós andemos em novidade de vida. (Rom. 6: 4) Pois o apóstolo Paulo nos elucida que esta vida é uma vida moral, uma vida de virtude, pureza , justiça e santidade: Mas a nossa conversão está nos céus; donde também esperamos ao Salvador Nosso Senhor Jesus Cristo. (Fil. 3: 20) Com Cristo somos vitoriosos sobre a morte natural e com ele temos o direito de dizer: Onde está ó morte a sua vitória? Onde está, ó morte, o teu aguilhão? (I Cor. 15: 55 – Os. 13: 14) A ressurreição de Cristo dos mortos aboliu o poder da morte e garantiu à humanidade superioridade e vitória por encher os corações de esperança que não falha, provando que a morte natural não é o fim da nossa vida. Existe vida depois da morte e nós através da morte natural seremos transportados da transitoriedade da vida limitada para a imortal, isto é a vida eterna; e dos sofrimentos e da miséria para a alegria e felicidade. Neste caso Paulo diz: Se nesta vida tão somente esperamos em Cristo, somos os mais infelizes de todos os homens. Mas agora ressuscitou Cristo dentre os mortos, sendo Ele as primícias dos que dormem. (I Cor. 15: 19-20)

As primícias*** foram apresentadas ao Senhor por serem consideradas as promessas da colheita de boa qualidade porvir. A ressurreição de Cristo mostra-nos que o levantar dos nossos corpos será como a força de Cristo no último dia como ensina o apostolo Paulo: O qual transformará o nosso corpo abatido, para fazer conforme ao seu corpo glorioso (Fil. 3: 21; I Jo. 3: 2) Isto é à semelhança do seu corpo quando transfigurado no monte Hermon**** diante dos seus três discípulos, e, que era a forma do Seu corpo depois da Sua ressurreição dos mortos.

Depois desta ressurreição Cristo não mais morreu nem nunca mais morrerá. Ao contrário, vive eternamente e dá vida aos mortos através da mediação da sua Santa Igreja que é o Seu Corpo Sacramental e está viva nEle. Seu efeito no mundo durante todo este tempo prova que Ele está vivo como prometeu estar – conosco até o fim dos tempos. Sua Igreja está firme sobre a rocha da fé nEle, e, as portas do inferno não prevalecerão contra ela. Seus alicerces não tremerão não importa quão cruel sejam os tempos contra ela.

Cristo está com cada crente fiel e prometeu dizendo: Porque onde se acham dois ou três congregados em meu nome, aí estou eu no meio deles. (Mt. 18: 20) Os discípulos do Senhor sabiam que não haveria ressurreição sem a morte e não haveria coroa de glória sem a coroa de espinhos. Portanto, quando aceitaram o Cristo crucificado como seu próprio Salvador, eles crucificaram-se a si mesmos em vida para viver não para si, mas para Cristo que vive neles, como ensina o apóstolo Paulo. Se eles estão mortos no pecado como Saulo de Tarso eles serão confirmados em Cristo como vasos escolhidos como o apostolo Paulo. A maioria dos santos no céu eram pecadores e cegos: tinham seus olhos, mas não viam. Mas, eles creram em Cristo o Salvador do mundo, e as escamas que cobriam seus olhos caíram. Seus olhos se abriram e viram a Luz de Cristo ressuscitado dos mortos, creram nele e assim ganharam a graça da justificação e da santidade, renovação e adoção. Tornaram-se filhos de Deus pela graça herdada do Seu Reino Celeste.

Vamos nos levantar com Cristo, meus amados, e vê-lo claramente dizendo: Olhai para as minhas mãos e pés, porque sou eu mesmo. (Lc. 24: 39) Ele é o Salvador que nos amou e que padeceu com suas chagas por nós; e nós – o que lhe demos?…

Vamos examinar nossas mãos e nossos pés. Nossas mãos têm praticado atos de bondade de caridade? Nossos pés têm trilhado o caminho da justiça e da integridade?

Vamos ouvir e ficar atentos e ouviremos o Senhor dizendo-nos: Paz seja convosco! E nossos corações se encherão de amor por Deus e para o próximo e estaremos em paz com Deus, conosco mesmo e com o nosso próximo.

Quando chegar o tempo para deixar esta existência vã, nossas almas estarão tranqüilas e nossos desejos estarão inflamados voltados para Cristo como disse o apóstolo Paulo: tendo desejo de ser desatado da carne, e estar com Cristo, que é sem comparação muito melhor. (Fil. 1: 23) e não há dúvida que o Senhor prometeu seus discípulos dizendo: E depois que eu for, e vos preparar o lugar…para que onde eu estou estejais vós também. (Jo. 14: 3).

Que o Senhor Deus nos torne merecedores de celebrar esta festa da Santa Ressurreição com alegria e felicidade. Quando o tempo de partir para junto dele chegar e nós caminharmos no vale das sombras da morte, não temeremos o mal porque Ele está conosco aliviando a distancia para nós com a Sua Luz. Para assim descansarmos em paz porque nossos olhos viram a salvação como Simão o Velho. Quando chegar a hora da qual o Senhor falou, todos estes que estão nos túmulos ouvirão a Sua voz e aqueles que obraram a verdade sairão para a ressurreição da vida enquanto que aqueles que obraram o mal seguirão para a ressurreição do julgamento. Que o Senhor nos torne dignos de levantarmo-nos para a ressurreição da vida para reinar com Ele para sempre a fim de celebrarmos a Festa da Ressurreição daquela alegria interminável, através da Sua graça. Amem.


*Livro que agrega vários sermões de diversos santos padres, patriarcas, etc…
** Quarto Superior – é na casa de Maria, mãe de Marcos, fica no nosso Mosteiro de São Marcos em Jerusalém e existe até hoje.
*** primícias – referem-se às primeiras frutas que eram ofertadas a Deus segundo a tradição bíblica.
**** Hermon ou Tabor

Tradução de:
Aniss Ibrahim Sowmy
Diácono Evangelista